Alice do cabelo aos caracóis

Alice em pequena tinha os cabelos aos caracóis. A mãe penteava-a com persistência. Que cabelo encaracolado é cabelo despenteado. Alice sofria. Gritava. Às vezes chorava. Aquelas manhãs eram uma tortura. Mas a criança havia de ir penteada para a escola. Que isto uma filha é a cara da mãe. E o cabelo da mãe era quase liso. Fora ondulado na infância, mas as ondas acalmaram-se pelo abuso do pente. A mãe da mãe de Alice também se chamava Alice. E nas poucas fotografias que dela havia, Alice nunca a chegou a conhecer, a senhora, mesmo já de idade, tinha ainda um cabelo farto, todo aos caracóis. Alice tinha a quem sair. Saía à outra Alice. A avó que não conheceu. Hoje Alice tem o cabelo apenas ondulado, como a mãe tinha em criança. Os caracóis perderam-se com a infância e Alice hoje só os reencontra em velhas fotografias. Suas e da avó que nunca conheceu.

Virtude

A maior virtude de uma pessoa virtuosa não é ter poucos defeitos, mas saber que tem muitos.

O último socialista

Durante muito tempo o partido socialista iludiu-nos com uma retórica de esquerda. Agora que o partido socialista perdeu a retórica, já não temos desculpas nem justificação para a nossa ilusão. O partido socialista quis convencer-nos que não haveria alternativa de esquerda sem o partido socialista. Sabemos hoje que o contrário é que é provavelmente verdadeiro. Não haverá alternativa de esquerda com o partido socialista. De certa forma, António Guterres foi o último socialista. A sua retirada foi igualmente a retirada do socialismo. Não no sentido em que Guterres fosse um exímio representante do socialismo, mas na medida em que foi o último representante do último reduto de socialismo que então restava no partido socialista: o catolicismo.

Diferença e repetição

Tudo em mim é imitação, ou pouco mais do que isso. Vou imitando, melhor ou pior, e melhor ou pior imaginando que sou original. E afinal os passos que dou, já por outros foram dados. E as palavras que digo, tantas vezes já foram ouvidas. O que de novo trazemos ao mundo não é tanto isso que imaginamos trazer mas o imaginarmos que alguma coisa de novo trazemos. E afinal até nisso somos iguais a todos os mais, que não sabendo que repetem, fazem outra vez como se a primeira fora.

Esquerda, direita, volver

Se a cruz que se coloca no boletim de voto, de alguma maneira, nos define politicamente. Então suponho que sou de esquerda. Digo isto, tendo em conta que me parece quase impossível alguma vez votar no partido socialista. Nos partidos à direita deste também me parece difícil, embora menos impossível do que votar no dito socialista. Não compreendo aliás, é mesmo coisa que me ultrapassa, porque raio as pessoas que são, ou se imaginam, de esquerda, e votam no dito socialista, não concebendo votar à sua esquerda, não passam a votar no partido dito social democrata. Se calhar é porque são de direita.

O mundo perfeito ao arrastão

De toda a blogosfera, incluindo a que não conheço, há dois blogues a que sou absolutamente fiel, e que se tornaram para mim leitura obrigatória. O mundo perfeito e o arrastão.

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Este blog ou é egocênctrico ou é uma tentativa de transformar jctp em "marca". Ou é outra coisa qualquer. O tempo o dirá. Que é sempre o tempo quem estas coisas decide. Ou ajuda a decidir. Estas e todas as outras.